É de conhecimento dos irmãos, que Clemente XII não foi o primeiro a condenar a Maçonaria. Um grande número de governantes, achavam ser seu dever, aprovar medidas contra a ação, segundo eles, invasora das sociedades secretas. Na França, já haviam ocorrido intervenções da polícia contra as Lojas, o Cardeal Fleury, primeiro ministro de Luís XV, proibiu em setembro de 1737, por razões de segurança, a formação de associações, especialmente de frey-maçons. Dois anos antes os maçons haviam sido proscritos na Holanda, exemplo que outros governos seguiriam, como a República de Genebra, do Condado de Baden e da cidade hanseática de Hamburgo. Na cidade de Roma, Clemente XII, após adotar as políticas restritivas as sociedades secretas, acrescenta a proibição consciente de se unir em “assembleias, reuniões, conventículos ou grupos, chamados vulgarmente de Liberi Muratori ou Franco-maçons”.
Advirto aos irmãos que as restrições impostas, não se restringiam aos maçons, mas, a todos que se reunissem ou organizassem reuniões reservadas e sem a autorização para a sua realização. Ressalto ainda que as proibições, tinham cunho político e administrativo. Contudo, em função da não separação administrativa religiosa no âmbito legal, político e administrativos, as restrições e condenações, tomaram a conformação conhecida.
Os motivos alegados nas documentações pontifícias eram que: “homens de todas as religiões e de toda seita, dando-se uma aparência de honestidade natural, ligam-se uns aos outros por um pacto tão estrito quanto impenetrável, segundo as leis e os estatutos que eles mesmos elaboraram, e se obrigam, por um juramento prestado sobre a Bíblia e sob graves penas, a ocultar em um silêncio inviolável tudo o que fazem na obscuridade do segredo”.
Outra causa alegada é que “essas sociedades ou conventículos deram lugar, no espirito dos fiéis, às suspeitas tão bem fundadas, que o fato de se inscrever nessas sociedades é, para as pessoas honestas e prudentes, marcar-se com o selo da perversão e da maldade. Essa suspeita ganhou tanto corpo que, em muitos Estados, as sociedades mencionadas foram, já há algum tempo, proscritas e exiladas, como contrárias à segurança dos reinos”.
Foi por atribuir efeitos danosos à sociedade advindos destes conventículos, não somente para a tranquilidade dos Estados Temporais, mas também para a salvação das almas, e como não poderiam estar de acordo com as leis civis e canônicas, e por causas outras de conhecimento destas autoridades, não explicitadas, foi decretado a proibição das sociedades de franco-maçons.
“Nós proibimos rigorosamente, e em virtude da santa obediência, a todos e a cada um dos fiéis de Jesus cristo, de qualquer estado, grau, condição, dignidade e proeeminência que eles sejam, leigos ou clérigos, seculares ou regulares, mesmo os que mereceriam qualquer menção particular, que ousem ou presumam, sob qualquer pretexto que seja, sob qualquer cor que seja, a entrada nas citadas sociedades de Liberi Muratori ou franco-maçons ou qualquer que seja o nome que elas tenham”. E “de propagar, sustentar ou receber em suas casas ou dar abrigo às mesmas em outros locais, e escondê-las”. E, ainda, “de nelas se inscrever, a elas se unir e assistir às reuniões, ou dar a elas a possibilidade e os meios de se reunir, de fornecer a elas seja o que for, dar conselho, ajuda ou apoio às mesmas, aberta ou secretamente, direta ou indiretamente, por si mesmo ou pelo intermédio de outras pessoas, de qualquer maneira que seja”. E também, “de exortar os outros, incitá-los, obriga-los a se inscrever nessa espécie de sociedade, tornar-se membros delas e assistir às reuniões, ajuda-las e sustentá-las de qualquer maneira que seja, ou lhes dar conselhos”.
Além disso, “ordenamos de maneira absoluta que eles se abstenham de todo o relacionamento com essas espécies de sociedade, assembleias, reuniões, grupos ou conventículos, sob pena de excomunhão incorrida ipso facto e sem necessidade de outra declaração. Ninguém poderá dar absolvição para isso, exceto Nós, ou o Pontífice romano do momento, a menos que seja no artigo de morte”.
Esta é a primeira condenação pontifícia, a qual todos os outros pontífices se refeririam na renovação da excomunhão lançada contra a Maçonaria.
Vamos pontuar mais uma vez, os motivos alegados por Clemente II para decretar a condenação dos maçons, evidenciando que seu caráter e justificativas são de cunho político-administrativos e não em essência religiosos: em muitos Estados as Lojas foram proscritas e exiladas como contrarias à segurança dos Reinos e que essas sociedades trouxeram grandes males para a tranquilidade temporal dos Estados, e que elas não podem concordar com as leis civis, tudo isso naturalmente se deve ao juramento e ao segredo inviolável praticado pelos maçons; a união de homens de diversas religiões; a opinião de pessoas honestas e prudentes; os danos para a salvação das almas, que são causadas por tais reuniões e o que mais surpreende “...causas justas e razoáveis, conhecidas por nós”
A propósito desta última cláusula, Töhötöm Nagy destaca como Clemente II condenou a maçonaria pelo segredo de que ela se reveste, e, em seguida, ele mesmo dissimula as “outras causas justas conhecidas por Nós”.
Alec Mellor, sustenta a tese que o motivo oculto era a proibição da causa católica dos Stuart, para recuperar o trono perdido na Inglaterra, o qual, havia passado para as mãos da dinastia protestante dos Hanôver. No entanto, na ausência de documentação capaz de sustentar a tese proposta, vamos também expor a hipótese da expressão ter somente cunho protocolar usado na época.
Fica evidenciado que existiam razões de Estado para condenar a Maçonaria. Desta forma Clemente II, seguiu o exemplo de outros governos incomodados diante do clima de segredo e de juramento de que era cercada a maçonaria. Dentro dessa ordem de ideias, é interessante observar, como assinala o Dicionário da Fé Católica, que medidas de repressão contra a maçonaria foram tomadas até mesmo pelos magistrados protestantes da Holanda (em1735), pelos de Hamburgo, da Suécia e de Genebra em 1738, pelos de Zurique em 1740 e pelos de Berna em 1743.
Segundo as autoridades dos governos da Europa Continental, Católicos e Protestantes, concordavam, que o manto da clandestinidade não agradava, pois fazia com que estes governos perdessem o controle sobre as ações e pensamentos os quais eram por ventura discutidos.
Desta forma, retorno a tese proposta aqui, que o verdadeiro problema do confronto que existia entre Roma e a Maçonaria tem seu centro nos motivos concernentes à segurança dos Estados, contudo ficava difícil estabelecer o limite entre o governante político e o representante da Igreja. No entanto, teologicamente falando, e já que Roma queria e devia dar à sua proibição uma justificativa do tipo religiosa, imponha-se dizer no que a franco maçonaria era condenável.
Dificilmente ela poderia ser tida como Herética, pois não formulava nem defendia nenhuma heresia, nem mesmo negava nenhum dogma, nem nas constituições de Anderson, a qual também não colocada no index pelo Santo Ofício
O mais curioso e paradoxal na Bula é que Clemente II condenou a maçonaria porque nela eram admitidos indistintamente católicos e protestantes, já que justamente na Inglaterra antipapista e anticatólica, entre 1723 e 1738, a Franco-Maçonaria, longe de ser hostil, era uma das raras organizações que acolhia os católicos a ponto de, em 1729, ter sido nomeado Grão-Mestre da Inglaterra um Católico, Thomas, duque de Norfolk. O mesmo também se pode dizer da Irlanda, onde os infortunados católicos encontraram nas Lojas um asilo pacifico para se reunirem entre si e terem ao mesmo tempo um contato mais humano com protestantes tolerantes.
Bibliografia: Ferrer-Banimeli, José Antônio. Arquivos secretos do Vaticano e a franco maçonaria. São Paulo: Masdras, 2010.
Por Ir.·. Khalil Augusto Botelho Nogueira.
M. I. e Membro da Academia Maçônica de Letras Ciências e Artes da Região Grapiúna (AMALCARG), Cadeira nº 11.