Por Idiana Tomazelli | Folhapress

Os desembolsos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social) para financiar a exportação de bens produzidos no Brasil alcançaram US$ 1,6 bilhão neste ano, o maior patamar na modalidade desde 2016.

O valor representa mais do que o total custeado pela instituição em 2021 e 2022 somados. A Embraer é uma das principais tomadoras da linha de crédito, usada para apoiar o embarque de 67 aeronaves para o exterior.

A retomada dos desembolsos é uma estratégia defendida pela atual direção do banco, sob o comando de Aloizio Mercadante (PT).

Após o crédito do BNDES encolher nos governos Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PL), a nova gestão estabeleceu como meta dobrar de tamanho até 2026, último ano de mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Embora não haja um valor específico almejado para 2024, a intenção é seguir com a expansão dos repasses, sobretudo no segmento de exportação, afirma o diretor de Desenvolvimento Produtivo, Inovação e Comércio Exterior do BNDES, José Luis Gordon.

"Um dos pilares da agenda de neoindustrialização é um setor industrial exportador importante, que ganha mercado, ganha escala, gerando mais emprego aqui no Brasil", diz o diretor.

"Nos aproximamos do setor empresarial, fizemos uma linha de US$ 2 bilhões, reduzindo em até 60% o spread do banco para a exportação. Isso gerou uma demanda de US$ 4 bilhões em projetos para o pré-embarque [que financia a produção dos bens que serão exportados]", acrescenta.

Segundo ele, a Embraer é a principal demandante da linha de crédito. O banco já aprovou um apoio de quase R$ 10 bilhões neste ano, em valores convertidos. A aprovação é uma etapa anterior ao efetivo desembolso do empréstimo.

No entanto, a redução do spread também abriu caminho para que outras empresas do ramo de alimentos, de máquinas e equipamentos e do setor automotivo passassem a pedir crédito no BNDES para financiar a exportação. "Conseguimos diversificar bem esse pool de empresas apoiadas", diz Gordon.

Os números recordes têm sido exaltados pela direção do banco como um dos símbolos da retomada do banco no financiamento à indústria.

Procurada, a Embraer informou que "o financiamento a exportações de aviões é uma prática comum em todos os países fabricantes de aeronaves" e que o mecanismo "é fundamental para as exportações brasileiras de alta tecnologia e de alto valor agregado, mantendo a geração de centenas de milhares de empregos em toda a cadeia aeronáutica brasileira".

"A Embraer tem planos de continuar crescendo ao longo dos próximos anos e, para isso, o papel do BNDES é estratégico para continuarmos produzindo tecnologia aeronáutica no país e exportando aviões do Brasil para o mundo", diz a empresa, em nota. A companhia destaca ainda que as condições de financiamento aplicadas pelo país são definidas por parâmetros internacionais.

O financiamento ao embarque de bens para o mercado externo é uma das categorias de crédito à exportação já operadas pelo banco. Outra, mais polêmica, é o financiamento a obras e outros serviços prestados por empresas brasileiras no exterior --o que inclui obras de engenharia.

Esse tipo de crédito está suspenso desde 2016, quando grandes construtoras do país beneficiadas pela linha passaram a ser investigadas na Operação Lava Jato.

No passado, a modalidade serviu para bancar obras controversas, como o metrô de Caracas, na Venezuela, e o Porto de Mariel, em Cuba --cuja dívida contraída o país diz hoje não ter como pagar.

Recentemente, o governo Lula enviou ao Congresso Nacional um projeto de lei para autorizar a retomada das operações de financiamento à exportação de serviços. A proposta, discutida previamente com o TCU (Tribunal de Contas da União), ainda precisa do aval dos parlamentares.

Gordon avalia que, uma vez aprovada a agenda econômica prioritária no Congresso, o banco de fomento terá mais espaço para dialogar com deputados e senadores sobre a proposta ao longo de 2024.

Segundo ele, alguns parlamentares já deram sinalização favorável à iniciativa. Outra corrente, porém, defende a necessidade de essas operações passarem pelo aval prévio do Congresso.

O deputado Mendonça Filho (União Brasil-PE), ex-ministro da Educação de Temer, é autor de uma PEC (proposta de emenda à Constituição) para atribuir ao Congresso a competência exclusiva de "autorizar a realização de operações de crédito por instituições financeiras controladas pela União, sempre que o objeto da operação vier a ser executado fora do país".

Procurado pela reportagem, ele diz que a retomada da exportação de bens pelo BNDES "é uma política necessária". "Um país que tem inserção internacional forte precisa ter financiamento", afirma.

Ele diz que sua proposta é muito mais centrada nas operações cujo risco final seja assumido por um país estrangeiro --como era o caso nas obras de engenharia financiadas no exterior.

"Foi essa lógica que levou a gente a colocar milhões de dólares de recursos do contribuinte brasileiro para financiar Mariel, até hoje sem nenhum retorno para o Brasil, o metrô de Caracas, na Venezuela, com grandes prejuízos", critica.

A ideia, segundo ele, é condicionar uma política de financiamento externo ao aval prévio do Legislativo.

"Não há dispositivo que obrigue a ter autorização operação por operação", afirma. "Uma política de crédito para exportação de aviões é indiscutível, pode ter uma política de crédito mais robusta. Agora, vai financiar uma obra num país, uma hidrelétrica, um ônibus, o Congresso tem que deliberar."

O deputado argumenta que a proposta não pretende criar obstáculos à inserção internacional do Brasil, mas permitir que o Congresso dê as linhas gerais de atuação dos bancos públicos em termos de crédito à exportação.

"A PEC é mais principiológica, ela não conflita diretamente com o projeto [do governo]. A intenção é que o Congresso participe da política. Não será um aval operação a operação", diz.