O filósofo alemão Immanuel Kant certa vez condensou toda sua filosofia em três perguntas fundamentais: o que posso saber, o que devo fazer e o que posso esperar.  

Essas questões, longe de serem meramente filosóficas, são profundamente práticas diante de um mundo em metamorfose acelerada. A inteligência artificial, a biotecnologia, a automação e a digitalização de quase todos os aspectos da vida nos oferecem novos conhecimentos, mas também nos alertam para os limites do raciocínio. Nem tudo pode ser previsto por algoritmos ou resolvido por dados. Há um espaço onde a razão precisa ceder lugar à fé. Não necessariamente uma fé religiosa, mas uma fé na capacidade humana de criar, de se adaptar e encontrar sentido mesmo no caos.

Neste cenário, a figura de Exu, o orixá das encruzilhadas, surge como um símbolo poderoso. Ele representa o movimento, a escolha, a ambiguidade. Nos lembra que o conhecimento não é linear, que a verdade pode ter múltiplas faces e que toda inovação carrega consigo riscos e possibilidades.  

Assim como Kant nos alerta que não podemos saber tudo, Exu nos ensina que o saber é também intuição, escuta e jogo de linguagem. Saber, hoje, é reconhecer nossos limites e, ao mesmo tempo, confiar na nossa capacidade de atravessar a incerteza.

A segunda pergunta de Kant: "o que devo fazer?"  ganha urgência em um mundo onde as decisões tecnológicas têm impactos éticos profundos. Usamos máquinas que aprendem, sistemas que decidem por nós e redes sociais que moldam nossos comportamentos. Mas e a nossa responsabilidade?  

Exu, com sua ética do movimento e da reciprocidade, nos lembra que toda escolha abre uns caminhos e fecha outros. Agir, hoje, é escolher com consciência, é pensar nas consequências das nossas decisões. Usar a tecnologia para ampliar nossa dignidade e autonomia, não para reduzi-las.

Por fim, Kant nos pergunta: "o que posso esperar?"  

Em tempos de crise climática, desigualdade social e instabilidade global, a esperança parece frágil. Mas é justamente aí que ela se torna mais necessária.  

Esperar, como diz outro filósofo, o francês Gabriel Marcel, é respirar com a alma. Não se trata de ser um boboca otimista. Mas acreditar que nossas ações têm valor, mesmo quando os resultados não são imediatos. Exu, com seu riso e sua sabedoria, nos lembra que toda crise é também uma oportunidade. Toda encruzilhada é um convite à escolha. E toda escolha é uma chance de criar um futuro diferente e melhor.

Bruno Calheira  
Técnico Judiciário, Artista e Pensador
site: calheira.com